Por si mesma, a Bíblia Sagrada se apresenta em duas partes bem distintas de diversos modos: Antigo e Novo Testamento. Outras distinções surgiram no correr dos séculos, algumas vezes pela necessidade de dividir-se o conteúdo de seus textos de maneira lógica, outras vezes pelo costume das leituras que se faziam, antes nas sinagogas e depois nas igrejas, outras ainda pela exigência didática dos estudos, como é o caso da divisão em capítulos e versículos.
1 — Divisão lógica
Quando e como a Bíblia foi organizada em capítulos e versículos?
Segundo o Sacrossanto Concílio Tridentino, divide-se o Antigo Testamento em quarenta e quatro livros, sendo que as Lamentações e a Profecia de Baruc se juntam ao livro de Jeremias. Caso se separem esses dois livros de Jeremias e também se ponha à parte a carta de Jeremias, é certo que se devem contar quarenta e sete livros escritos no Antigo Testamento.
Por outro critério condizente com a matéria, divide-se o Antigo Testamento em livros históricos, didáticos e proféticos.
Perfazem o número de vinte e um os livros históricos, a saber: o Pentateuco (ou Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), Josué, Juízes, Rute, 4 dos Reis, 2 dos Paralipômenos, 2 de Esdras, Tobias, Judite, Ester, 2 dos Macabeus.
Os livros didáticos somam sete, a saber: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Sabedoria e Eclesiástico.
Os livros chamados proféticos são dezesseis: 4 profetas maiores: Isaías, Jeremias (com as Lamentações, Profecia de Baruc, Epístola de Jeremias) Ezequiel, Daniel; e os 12 menores: Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias.
Os hebreus, é necessário notar, em sua divisão utilizam um outro critério.
Pelo mesmo Concílio Tridentino foi dividido o Novo Testamento logicamente em vinte e sete livros, que antigamente se dividiam apenas em duas grandes partes: Evangelhos e Escritos dos Apóstolos.
Segundo a matéria e a exemplo do Antigo Testamento, dividem-se ainda em livros históricos, didáticos e proféticos.
Os históricos são cinco: os quatro Evangelhos e os Atos dos Apóstolos.
São chamados livros didáticos os vinte e um livros seguintes: catorze epístolas de São Paulo, a saber: aos Romanos, 2 aos Coríntios, aos Gálatas, aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses, 2 aos Tessalonicenses, 2 a Timóteo, a Tito, a Filêmon, aos Hebreus; e sete epístolas católicas: de Tiago, 2 de São Pedro, 3 de São João e uma de Judas.
O livro profético, único, é o Apocalipse de São João Evangelista.
2 — Divisão litúrgica
É simplesmente a escolha de tal ou tal texto conforme as festas litúrgicas. Os hebreus também tinham sua divisão litúrgica, mas seguindo outro critério.
3 — Divisão didático-prática
A divisão da Bíblia em capítulos e versículos não existia nos Livros originais, que não continham sequer separação entre parágrafos, nem vogais, sem sinais de pontuação, nem títulos e subtítulos para ajudar a localizar passagens específicas.
A necessidade de dividir o texto sagrado surgiu especialmente para facilitar a leitura litúrgica, mas tornou-se fundamental também para os estudos mais técnicos.
Houve diversos sistemas, tanto entre os judeus (‘Sedarim’, ‘Perashiyyot’, ‘Pesuquim’) como entre os cristãos (‘Canones Eusabiani’, de Eusébio de Cesareia), que dividiu os textos em 1.162 seções.
Divisão em capítulos
Stephen (ou Estêvão) Langton, Arcebispo da Cantuária que havia sido chanceler da Universidade de Paris, procedeu à divisão do Antigo e do Novo Testamentos em capítulos, a partir do texto latino da Vulgata de São Jerônimo, para facilitar os estudos universitários, ente os anos 1214 e 1226[1].
Da Vulgata, passou ao texto da Bíblia hebraica, ao texto grego do Novo Testamento e à versão grega do Antigo Testamento. Estabeleceu uma divisão em capítulos, mais ou menos iguais, muito similar à que temos em nossas Bíblias impressas. Esta divisão se tornou universal.
Divisão em versículos
São Pagnino (1541), judeu convertido, depois dominicano, originário de Luca (Itália), dedicou 25 anos à sua tradução da Bíblia, publicada em 1527, e foi o primeiro a dividir o texto em versículos numerados.
Essa versão foi impressa em Lion. Era uma versão bastante literal que foi reimpressa várias vezes.
Roberto Estienne, prestigioso impressor, realizou a divisão atual do Novo Testamento em versículos, em 1551. Em 1555, procedeu à edição latina de toda a Bíblia. Para os versículos do Antigo Testamento hebraico, ele utilizou a divisão feita por São Pagnino. Para os demais livros do Antigo Testamento, elaborou um sistema próprio e utilizou para o Novo Testamento aquela que, poucos anos antes, ele mesmo havia realizado.
O recurso de dividir o texto bíblico em capítulos e versículos numerados permite, desde então, encontrar imediatamente uma passagem, seja qual for a paginação adotada por uma edição. Esta é uma ferramenta fundamental para os pesquisadores e para que todo leitor tenha uma mesma referência.
A primeira Bíblia impressa que incluiu totalmente a divisão de capítulos e versículos foi a chamada Bíblia de Genebra, publicada em 1560, na Suíça. Seus editores optaram pelos capítulos de Stephen Langton e os versículos de Robert Estienne, conscientes da grande utilidade que teriam para a memorização, localização e comparação de passagens bíblicas.
Em 1592, o Papa Clemente VII mandou publicar uma nova versão da Bíblia em latim, para uso oficial da Igreja Católica, e nela se incluiu a divisão atual de capítulos e versículos.
Assim, no final do século XVI, os judeus, protestantes e católicos haviam aceitado a divisão em capítulos introduzida por Stephen Langton e a subdivisão em versículos introduzida por Robert Estienne.
Desde então, essas divisões em capítulos e versículos tornaram-se o padrão para se localizar os versículos da Bíblia, e até hoje são aceitas universalmente.
Nota:
[1] Há controvérsia entre autores com relação a data exata em que se deu esse trabalho.