NO MUNDO EXISTEM, atualmente, cerca de 50 mil religiões diferentes(!)[1], com credos totalmente distintos. Diante disso, muitas vezes somos questionados: como saber que a nossa religião é a verdadeira? Porque, se há uma verdade, necessariamente a(s) religião(ões) que prega(m) esta verdade é(são) verdadeira(s), e as outras todas, se vão contra a verdade, tem que ser falsas.
O que diferencia a doutrina católica de tantas outras crenças religiosas e superstições presentes no mundo? Há aqueles, mesmo entre católicos professos, que – seja por ignorância ou por má vontade – afirmam que “todas as religiões são iguais” e/ou igualmente verdadeiras; segundo esse absurdo ponto de vista, ser cristão ou satanista, por um exemplo extremo, não passaria de uma opção individual e, assim, bastaria ser uma “boa pessoa” para obter a salvação. Estes condicionam sua fé a um fator meramente cultural. Temos aí os famosos “católicos do IBGE”, isto é: pessoas que se declaram católicas, mas não conhecem nada sobre a Religião e se declaram assim simplesmente por razões familiares ou por mera convenção social.
No sentido contrário, embora o fator familiar e cultural seja importante no caso das crianças, que são ainda imaturas para meditar racionalmente sobre assunto tão sério, um católico maduro, ao ser questionado sobre o porquê de seguir a Cristo e ser membro da Igreja, deve sair da resposta infantil do “porque é a minha opção” ou “porque mamãe e papai são”, e demonstrar com clareza e com firmeza a razão pela qual escolheu aderir ou permanecer no catolicismo. Não foi neste sentido que nos orientou o Apóstolo, como sempre lembramos? “Estai sempre prontos a responder para vossa defesa a todo aquele que vos pedir a razão de vossa esperança” (1Pd 3,15).
Quais são, afinal, os motivos que diferem a Doutrina Católica das demais superstições religiosas? É o que veremos e analisaremos neste estudo.
O Probema do relativismo
Relativismo religioso é uma espécie de doutrina travestida de neutralidade – pensada sob medida para os que gostam de se postar em cima do muro e aí permanecer – mas que não passa da mais pura insanidade.
O relativismo ensina que todas as religiões são igualmente boas e/ou verdadeiras e que, ao mesmo tempo, nenhuma poderia ser considerada a verdadeira. Para seus adeptos, os credos religiosos individuais se devem a fatores meramente culturais, sendo definidos exclusivamente pelo meio onde se vive. O relativismo exclui o caráter filosófico, racional e revelado da verdadeira Religião; resumindo-a à mera tradição humana passada de pai para filho (assim como a escolha de um time de futebol), torna-a descartável e irracional. Mas, ora, é óbvio que o
próprio relativismo é que, de fato, possui esses atributos, e os exemplos que poderíamos apresentar para demonstrá-lo são inúmeros. Como poderiam, por exemplo, tanto o catolicismo quanto o protestantismo serem igualmente verdadeiros se, afinal, a Virgem Maria não pode ser ao mesmo tempo sempre virgem (como prega o catolicismo) e ter tido outros filhos com José (como prega o protestantismo)? E como poderíamos dizer que corresponde à verdade crer que Deus é um só (como pregam as religiões monoteístas) mas também é verdade que existem milhares de deuses (como pregam as politeístas, como o hinduísmo)? Como crer que nossa alma é imortal (como prega o catolicismo) e mortal (como prega o adventismo) ao mesmo tempo? E como dizer que morremos uma só vez (como prega toda religião de confissão cristã) e ao mesmo tempo que “reencarnamos” inúmeras vezes em outros corpos (como prega o espiritismo)? Por óbvio e por exigência da razão mais elementar, uma crença não pode ser tão verdadeira quanto outra que afirme o seu contrário. Para que uma seja verdadeira, a outra precisa, necessariamente, não ser.
Ninguém nega que existam fatores culturais que possam pesar na escolha de uma religião, e nem que determinadas devoções ou práticas religiosas estejam relacionadas a esses mesmos fatores. Entretanto, não é isso o que fundamentalmente definirá a escolha consciente de alguém em uma religião. Existem ateus nascidos em famílias religiosas, católicos nascidos em famílias protestantes e vice-versa, e por aí se vai.
Somente o Catolicismo
Isto é tudo o que um relativista não quer ouvir, mas o que define uma pessoa no catolicismo é o fator puramente racional e filosófico: diferente de todos os outros credos e de todas as superstições religiosas, o catolicismo é coerente. Todas as demais religiões apresentam contradições em suas concepções religiosas, o que as torna incoerentes e contraditórias. Em resumo, um dos grandes princípios da Filosofia, o chamado “princípio da não-contradição” torna todas as demais religiões irracionais e tiram dela qualquer crédito que lhes seria possível atribuir.
É claro que nos serão apresentadas, por nossos inimigos, supostas contradições católicas também. Todavia, o católico bem-instruído ou o próprio Magistério da Igreja refutará todas elas com facilidade, demonstrando o esplendor daquela que é “a coluna e o sustentáculo da Verdade” (cf. 1Tm 3,15) para aquele que crê.
Já os primeiros cristãos utilizavam-se desse princípio da não-contradição para converter os pagãos. O cristão Hérmias, o Filósofo, escreveu no segundo século da Era Cristã uma obra intitulada “Escárnio dos filósofos pagãos”, cujo intuito era expor as contradições da religião dos gregos e mostrar-lhes que ali não poderia residir a Verdade.
Vejamos, como exemplo, uma das inúmeras e claras contradições da principal corrente religiosa derivada do catolicismo, o protestantismo: ao mesmo tempo em que renegam a infalibilidade dos concílios católicos, utilizam o cânon do Novo Testamento que foi proposto infalivelmente pelos concílios católicos de Hipona e Cartago no século IV.
Já os ditos “ortodoxos”, ao mesmo tempo em que pregam que se deve respeitar a Tradição Apostólica, acreditam que não são obrigados a concordar com o que ensina a Igreja de Roma, nem mesmo com os Padres dos primeiros séculos, os quais afirmam textualmente, com Santo Irineu de Lião (nasc. 130 d.C.): «Com efeito, deve necessariamente cada igreja estar de acordo com esta [a Igreja de Roma], em virtude de sua autoridade preeminente, isto é, o fiel em toda parte, na medida em que o Tradição foi preservada continuamente por aqueles [fieis homens ] em toda parte.» (Contra as Heresias, Livro III, 3, 2).
Outro exemplo é o dos espíritas, que, ao contrário do que pretendem, não podem de modo algum ser considerados cristãos – já que negam a divindade de Jesus Cristo. Estes, por sua vez, afirmam que devemos ser caridosos na Terra porque “fora da caridade não há salvação”, mesmo acreditando que todos (independentemente de suas obras) renascerão até se tornarem “espíritos de luz”. Segundo tal doutrina, não houve sentido absolutamente nenhum no Sacrifício de Cristo, já que nossa redenção virá infalivelmente por meio de uma sucessão de “reencarnações”. Além da clara impossibilidade simplesmente matemática da teoria da reencarnação (basta notar o imenso crescimento demográfico na história do nosso mundo), é desnecessário dizer que não pode haver aprendizado nem “evolução do espírito” se, ao reencarnar numa nova identidade, o sujeito se esquece de tudo o que viveu e aprendeu na vida anterior.
Como vemos, boa parte das principais doutrinas, ainda que procurem aparentar aspectos do catolicismo, são inconsistentes diante da sua própria lógica, e por isso podem, com razão, ser chamadas falsas.
Não podemos, entretanto, obrigar alguém a pensar de maneira racional. Muitos preferem e escolhem crer naquilo que pensam que lhes convém, seja porque se “sentem bem” em determinado lugar, porque alguma doutrina lhes emocione ou coisa que o valha. Se alguém, após receber a justa instrução, mesmo assim recusa-se a ouvir a voz da razão, não pode a Verdade lhe ser imposta. Deus mesmo, antes de tudo, respeita o nosso livre direito de escolha..
Condenações do Magistério ao relativismo
Ao contrário do que muitos imaginam – e, pior, erradamente ensinam – o Papa Paulo VI, que presidiu o polêmico Concílio Vaticano II, ao afirmar o direito humano à liberdade religiosa, lembrou que «o Concílio, de modo nenhum, funda um tal direito à liberdade religiosa sobre o fato de que todas as religiões e todas as doutrinas, mesmo errôneas, tenham um valor mais ou menos igual; funda-o, ao contrário, sobre a dignidade da pessoa humana, que exige que não se a submeta a constrições exteriores, tendentes a restringir a consciência na procura da verdadeira religião e na adesão à mesma»[3].
Ainda assim, esta grande “inovação” trazida pelo Concílio desperta discussões teológicas acaloradas até os nossos dias, especialmente por conta daqueles que aparentemente se tornaram maioria a ocupar as instalações e espaços da Igreja, e servem mais a um fictício e anticatólico “espírito do Concílio” do que a Deus Nosso Senhor. A letra do próprio Concílio, todavia, diz o seguinte: «O Sagrado Concílio professa, em primeiro lugar, que o próprio Deus manifestou ao gênero humano o caminho por que os homens, servindo-o, podem ser salvos e tornar-se felizes em Cristo. Cremos que esta única verdadeira religião se verifica na Igreja Católica»[4].
O mesmo o fez João Paulo II em suas Encíclias Veritatis Splendor (1993) e Evangelium Vitae (1995). Bento XVI, por sua vez, com grande propriedade, condenou veementemente o relativismo, classificando-o insistentemente como «ditadura do relativismo»[4].
Por fim, vale lembrar que há um dogma de Fé totalmente avesso ao relativismo: o «Extra Ecclesia nulla sallus» (Fora da Igreja não há salvação), que também deve ser bem compreendido, conforme parágrafos do Catecismo da Igreja Católica reproduzidos abaixo:
«Fora da Igreja não há salvação»
846. Como deve entender-se esta afirmação, tantas vezes repetida pelos Padres da Igreja? Formulada de modo positivo, significa que toda a salvação vem de Cristo-Cabeça pela Igreja que é o seu Corpo: O santo Concílio «ensina, apoiado na Sagrada Escritura e na Tradição, que esta Igreja, peregrina na Terra, é necessária à salvação. De fato, só Cristo é Mediador e Caminho de salvação. Ora, Ele torna-se-nos Presente no seu Corpo, que é a Igreja. Ao afirmar-nos expressamente a necessidade da fé e do Batismo, Cristo confirma-nos, ao mesmo tempo, a necessidade da própria Igreja, na qual os homens entram pela porta do Batismo. É por isso que não se podem salvar aqueles que, não ignorando que Deus, por Jesus Cristo, fundou a Igreja Católica como necessária, recusam-se a entrar nela ou a nela perseverar».
847. Esta afirmação não visa aqueles que, sem culpa da sua parte, ignoram Cristo e a sua Igreja: «Com efeito, também podem conseguir a salvação eterna aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo e a sua Igreja, no entanto procuram Deus com um coração sincero e se esforçam, sob o influxo da Graça, por cumprir a sua Vontade conhecida através do que a consciência lhes dita».
848. «Muito embora Deus possa, por caminhos só d’Ele conhecidos, trazer à fé, ‘sem a qual é impossível agradar a Deus’, homens que, sem culpa sua, ignoram o Evangelho, a Igreja tem o dever e, ao mesmo tempo, o direito sagrado, de evangelizar» todos os homens.
ConclusãoJesus o Cristo jamais pregou “verdades relativas”, mas ensinou verdades objetivas. Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida. Testemunhou o Apóstolo que ninguém vai ao Pai senão por Ele (cf. Jo 14,6). Não existe outro caminho ou “outra verdade”: todo aquele que nega conscientemente a Cristo e à sua Igreja, de acordo com Ele mesmo, «já está condenado» (Jo 3,18). E para aqueles que dizem que Jesus “não fundou igreja”, indicamos as seguintes passagens:
«E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja; as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na Terra será ligado nos Céus, e tudo o que desligares na Terra será desligado nos Céus.» (Mt 16,18-19);
«E, se recusar ouvir também a Igreja, seja ele para ti como um pagão e um publicano.» (Mt 18,17).
Devemos, sim, respeitar as opiniões alheias e procurar conviver bem com todas as pessoas; fazê-lo, porém, é coisa diferente de aceitar tudo ou considerar a tudo como verdade.
[1] MELTON, Gordon, Instituto para o Estudo da Religião Americana e Enciclopédia das Religiões Americanas, apud PAOLOZZI, Vitor. ‘Religiões brotam e morrem aos milhares’, disp. em:
https://cutt.ly/iv6UJW1 | acesso 26/4/2021.
[2] Paulo VI, Discurso ao Sacro Colégio e aos Prelados Romanos, in: Insegnamenti di Paolo VI, 14 (1976) 1088-1089.
[3] CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, NOTA DOUTRINAL: sobre algumas questões relativas à participação e comportamento dos católicos na vida política, nota 28.
[4] Por ex.: “Enquanto o relativismo, isto é, deixar-se levar ‘aqui e além por qualquer vento de doutrina’, aparece como a única atitude à altura dos tempos hodiernos. Vai-se constituindo uma ditadura do relativismo que nada reconhece como definitivo e que deixa como última medida apenas o próprio eu e as suas vontades”. (Papa Bento XVI, Homilia em 24 de abril de 2005)
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